O «mar português» de Pedro Colón (I) – Estado da Arte

Peneda (o Viso) – Vista sobre ria de Vigo e Atlântico

 

 

 

 

 

 

 

 

Pedro Madruga não pode ter sido apenas e, tão só, o belicoso senhor feudal de Soutomaior, que cinco séculos de historiografia repassaram, motu continuum, elevado bastas vezes a legendário estatuto, e outras tantas submerso entre as trevas do medievo mais profundo. Foi também um conde português, membro da corte primo-renascentista de que se fazia rodear “o Africano” Afonso V, “rei de Portugal e dos Algarves, daquém e dalém mar em África”, como então, significativamente, se intitulava.

Corte, que o historiador Saúl António Gomes, não hesitou em considerar como “uma das mais notáveis e civilizadas da época”, adjectivando consequentemente esse Príncipe, que biografava em 2006, como “erudito humanista”, bibliófilo, intelectual e esteta[1]. Sigue leyendo O «mar português» de Pedro Colón (I) – Estado da Arte

O «mar português» de Pedro Colón (V) – Teria estado na Mina?

 

Foz do rio Minho. Foto de Luís Miguel Cruz

 

Sobejam, pois, referências factuais, integrando as casas de Távora e de Pombeiro da Beira, no processo marítimo português, pelo menos desde os anos trinta do século XV, com particular incidência nas décadas de cinquenta e sessenta, em que o cargo de Almirante de Portugal foi exercido por dois dos seus elementos. É precisamente à data do falecimento do último destes (1467), que se vai negociar o matrimónio de Teresa de Távora (1468).

Que outra razão, que não a mais-valia do controlo extra de quase quarenta e cinco milhas da costa ocidental galega, levaria Afonso V de Portugal, a aceitar e promover a entrada de um nobre castelhano, numa das linhagens mais afectas ao seu conselho, à segurança da capital do reino, e à eventual política de sigilo atlântico a que já se referiram inúmeros estudiosos? E seria desprezável a capacidade mobilizadora e armadora, de uma casa como a de Soutomaior, nas rias de Vigo, Pontevedra e Arousa, quando Portugal se preparava para novas investidas norte africanas, ainda no âmbito do apelo de Calisto III à Cruzada anti-otomana[1]?

Pelas razões atrás evocadas, bem assim como pela constatação de que, entre os aliados familiares mais próximos, podia o conde de Caminha encontrar quem dominasse a grande maioria dos pontos-chave da costa portuguesa e dos leitos fluviais de maior relevância, deve poder questionar-se qual o verdadeiro papel que Pedro Álvares de Soutomaior representou na corte portuguesa, de 1469 a 1485. Tal janela interpretativa não pode mais ficar posta de parte, quer na historiografia galega, quer na portuguesa. Urge reequacionar a figura de Pedro Madruga, também enquanto homem de mar, armador ligado às rotas de comércio e corso, participante activo – directa ou indirectamente – no movimento renascentista dos descobrimentos marítimos da segunda metade do século XV português.

Termino com uma pergunta potencialmente perversa.

Atlântico e São Jorge da Mina

Após o pacto de Alcáçovas-Toledo que, em 1479, pôs fim à guerra de sucessão peninsular, o perdão do conde de Caminha dependia do acatamento das disposições ditadas pelos Reis Católicos. De todas, a mais importante e mais penalizante, seria a entrega de Tui e respectivo preito de vassalagem ao bispo Diego de Muros. Em finais de 1481, a cidade estava ainda na posse do governador Acuña, representante dos Católicos. O acordo com Soutomaior, estipulava que até 15 de Janeiro seguinte, esta lhe fosse entregue, para que pudesse cumprir os protocolos de menagem, reconhecendo a soberania do prelado. Contrariando as expectativas, Pedro Álvares não esteve presente, enviando procuradores[2].

Simultaneamente – segundo um estudo dedicado ao “Castelo da Mina” por Carlos Antero Ferreira – , navegava no atlântico, uma armada de dez caravelas, um navio pesqueiro e duas urcas, sob o comando de Diogo de Azambuja, fundeando na costa da Mina nesse mesmo 19 de Janeiro. Dois dias mais tarde, teve início a construção da primeira fortaleza portuguesa do litoral ocidental da África[3], onde Colón afirmou ter ido algumas vezes.

Escrevendo sobre Tui, Suso Vila documenta que, a 23 de Janeiro, ainda se esperava a qualquer momento, a vinda de Pedro de Soutomaior «a Caminna ou Valença ou daquel cabo», para que fosse a Tui cumprir o acordado com Acuña e o bispo Muros, o que só aconteceu passados quase três meses e meio, no princípio de Maio[4].

Entretanto, a fortaleza da Mina ganhava forma rapidamente. Em meados de Fevereiro estavam levantadas as muralhas e o sobrado da torre. Presume-se que a esse alucinante ritmo, estivesse concluída em finais de Março, senão mais cedo. Depois, o capitão-mor enviou de regresso a frota e, se a viagem de ida demorara cerca de cinco semanas, conclui-se que em Abril já os navios demandassem a costa portuguesa.

Pedro – que esse era também o nome de Colón segundo Lúcio Marineo Sículo[5], cronista dos Reis Católicos – poderia estar em todos os lugares do mundo conhecido de então, menos no norte português ou no sul galego; estrategicamente, talvez aguardasse apenas que o tempo ganho numa propositada demora lhe fosse favorável de alguma forma; mas o bom senso, obriga à pergunta: pela demora, teria o conde de Caminha estado na Mina?


[1] Gomes, S. A. (2006), pp. 177-178.

[2] Vila, S. (2010), pp. 176-177.

[3] Ferreira, C. A. (2007). Castelo da Mina. Da Fundação às Representações Iconográficas dos Séculos XVI e XVII. Lisboa, Portugal: Livros Horizonte, pp. 17-27.

[4] Vila, S. (2009). A cidade de Tui durante a Baixa Idade Media (1ª ed.). Noia, Galicia: Editorial Toxosoutos, pp. 165.

[5] Marineo Sículo, L. (31 de Julho de 2008). L. Marinei Siculi regii historiographi opus de rebus Hispaniae memorabilibus modo castigatum atq. Caesareae maiestatis iussu in lucem editum, 1533. (M. d. Enguia, Ed.), pp. 106v. Obtido em Janeiro de 2011, de Memoria Digital Vasca: http://hdl.handle.net/10357/374