Hernando Colón garantiu preto no branco na “Historia del Almirante” que o pai, na sua juventude, aprendeu as letras e estudou num lugar chamado Pavia. Não há pois quem pretenda discorrer sobre as origens do “descobridor” que se arrogue passar ao lado desta questão assaz particular.
E se a Pavia italiana – com o seu Studio Generale fundado em 1361 – sempre foi a escolha óbvia sendo a Lombardia região vizinha da Ligúria, também logo houve quem estranhasse a frequência de tão elevado lugar a imberbe cardador de lãs. E mais se pesquisando, se não achou registo que ali colocasse o futuro navegador.
Aventou-se então que o biógrafo – em parágrafos anteriores sempre avesso a afirmar o que não sabia – sucumbira ali à compreensiva tentação de valorizar a sabedoria paterna, usando de inverdade! E se assim não aconteceu, crédito se lhe dê que, melhor ou pior filtrada, tal informação lhe terá chegado por palavras do próprio pai, nalgum momento calmoso da última viagem de Cristobal às Illas e Tierra Firme de Castilla.
Dado em finais do século XIX o mote contestante por Celso Garcia de La Riega, surgiram adiante catalães identificando o minúsculo povoado de Pavia na região de Segarra, e portugueses a vila alentejana de Pavia, sem que em ambos os casos se entenda como se poderia então ter educado um menor de forma a poder vir a “entender os cosmógrafos”, sem a existência local de estudos-gerais, ou mosteiros que lhos ministrassem!
Muito recentemente, Fernando Branco – o português que mais se aproximou de uma identificação credível para um Colón exclusivamente lusitano -, lembrou o rio beirão de Pavia que atravessa o que em tempos foram as terras centrais do ducado de Viseu, título criado para o Infante D. Henrique – o das “descobertas” -, e integrado na coroa com a elevação de D. Manuel a rei de Portugal. Naquela região pôde igualmente identificar um mosteiro mendicante, com fundação de 1410: São Francisco de Orgens. Sendo o almirante devoto franciscano, facilmente se deduz ser esta referência à região do rio Pavia, um dos pontos de maior crédito na tese do engenheiro português.
Esgotando-se em tal Pavia as hipóteses esgrimidas até esta parte, estranha-se que a “mãe” de todos os enunciados não-genovistas, nunca tenha “baixado a terreiro”, reivindicando premissas semelhantes para a educação de um Colón nascido galego! Porque enquanto foi ilustre nativo de Pontevedra sem face conhecida, sempre se supôs instruído entre os beneditinos de São Xoán de Poio; e quando Philippot lhe deu o rosto de Pedro Madruga, se considerou sem mais demandas que a criação se dera entre os dominicanos de Tui, por influência da tutoria de frei Esteban de Soutelo.
E de facto, São Domingos de Tui foi o convento onde este professou e se fez mestre em Sagrada Teologia antes de 1424, ano em que Aureliano Pardo Villar o documenta, ainda ali residindo e ensinando. No entanto, em 1430 já é outro o convento de sua morada, onde é prior, e anos depois, em 1449 por ser eleito Provincial de España, é obrigado a visitações sistemáticas e a uma maior permanência em Castilla, perto da corte. Destituído por bula papal de Fevereiro de 1454, acusado pelo bispo Barrientos no âmbito da reforma da província, só então regressa ao ponto de origem da sua carreira, vivendo em Tui os anos que lhe restaram.
Não se sabendo pois onde se encontrava aquele tutor de Pedro Madruga no início do ano de 1441, impossível se torna atestar o que Alfonso Philippot e Suso Vila garantem: Pedro de Sotomaior “ingressa en el convento de Santo Domingo de Tui, donde cursa sus primeiros estúdios”.
Asseguram por outro lado os fundos documentais da colecção diplomática de São Domingos de Ribadavia, que frei Esteban de Soutelo ali exerceu o cargo de prior em 1430, eleito provavelmente para o triénio 1430-32, uma vez que em 1433 é já frei García de Cusanza o responsável máximo pelo mosteiro.
Prova a listagem da sucessão de priores no convento de Pontevedra afecto à mesma ordem – também publicada por Pardo Villar -, ser corrente que uma vez findo o tempo para que foram eleitos, permanecessem no mesmo convento assumindo novas ou resgatando antigas funções, chegando por vezes a ser reeleitos alguns anos mais tarde. Foi disso caso paradigmático em Pontevedra, frei Pedro de Salnés, prior entre 1432 e 1437, entre 1440 e 1441, em 1445, e num último período entre 1448 e 1451.
Viabilizam estes factos supra mencionados a hipótese de frei Esteban de Soutelo ter continuado a leccionar no convento de Ribadavia, assistindo mesmo ao incêndio que poucos anos mais tarde afectaria parte das instalações. Essa possibilidade autoriza a eventualidade de ainda ali residir quando, por manda testamentária de Fernan Yañez de Soutomaior (Novembro de 1440), tomou a seu cargo a educação para clérigo do jovem Pedro, bastardo que a história conhecerá pela alcunha de “Madruga”.
Acontece que nesses tempos medievos, a vila nascida na margem do rio Avia se conhecia pelo nome latino de Ripa Avie. Cabe ao padre Samuel Eiján tal afirmação, constante nas páginas da sua “Historia de Ribadavia”, e mais atesta que o nome porque actualmente se designa, só foi oficialmente adoptado em sessão camarária de 8 de Dezembro de 1860! Foneticamente soaria então como “Ripavia”, provavelmente com acentuação esdrúxula que lhe adviria pela aglutinação do “a”.
Decerto se não reunirão consensos avaliando semelhanças e igualdades. Nem tampouco se admitirá discutir, se a um velho almirante septuagenário coube pronúncia velada, ou a um jovem grumete ouvido menos atento em terras do Novo Mundo. Porém, a ninguém será indiferente que Ribadavia não tem por que não ser a Pavia onde o Colón galego, no entender do padre Las Casas “estudió los primeiros rudimentos de las letras, mayormente la gramática, y quedó bien experto en la lengua latina”.
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Parabens polo artigo, Antonio. Penso que atinaste de cheo na diaña. As veces esquecémonos que a biografía orixinal de Fernando Colón, estraviouse, e a que temos en castelán e a tradución dunha feita o italiano.
Não há nenhum rio Pavia em Portugal. O que há é um rio Paiva, afluente do rio Douro, e muito a norte de Viseu.
O Eng. Fernando Branco parte de uma boa ideia, mas o seu livro está cheio de lérias. Com tanta fé na internet et all, nem foi ver um mapa de Portugal (daqueles da minha Instrução Primária, por volta de 1950).
Sempre haverá professores, com minúscula.
O gato podia ao meno ter ido ver o nome do rio que passa em Viseu antes de mostrar ao mundo a sua ignorância